quinta-feira, 24 de junho de 2010

Pelotas por, Ana Paula Marroni Marques

Em uma de nossas saídas, mais precisamente no dia 26 de Abril, passamos pela Praia do Laranjal. E nessa saída, um dos fatos que me chamou bastante atenção foi a construção dos banheiros públicos em plena areia da praia. Confesso que até então ignorava o assunto e nem sequer fazia questão de formar uma opinião a respeito. Porém, quando o professor Maurício Polidori comentou sobre as obras comecei a perceber que aquilo realmente era um atentado ao nosso Laranjal. Não questiono a construção dos banheiros, e sim o local. Inadequado e irregular. A questão é que a areia da praia é área de preservação permanente, o que significa que é um local proibido para construções. Além disso, o banheiro tem forte impacto paisagístico, sendo localizado em frente a uma das figueiras mais importantes da orla da lagoa. (Ana Paula Marroni Marques)






Ser o que se é - Vitor Ramil


"Todos nós sabemos que se o Laranjal fosse praia de mar, sua história e, por extensão, a da cidade de Pelotas, seria muito diferente, para o bem e para o mal. Entre as coisas boas estaria o incremento da arrecadação municipal em função do turismo (bela alternativa para uma cidade pobre), pois se há coisa que turista adora é praia de mar. Aliás, quem não adora? Já entre as coisas ruins certamente estaria o fim do nosso relativo sossego, a desfiguração ambiental pela especulação imobiliária desenfreada etc. Mas se um banho de mar é capaz de lavar nossa alma na caótica Copacabana, haveria de lavá-la aqui também.O fato, porém, é que nossa querida e pacata praia é banhada pelas águas doces da Lagoa dos Patos, o que faz dela um local turístico modesto neste país de praias de mar esplendorosas. Sucessivas administrações municipais (pelo menos as que eu pude testemunhar) e empresários locais têm feito o que podem para atrair o turista. Não é tarefa fácil. Que atrativos tem o Laranjal a oferecer?Recentemente lancei um DVD que começa e termina na praia do Laranjal, mais precisamente no Valverde. Graças a um inesperado dia quente e luminoso de agosto (mas não surpreendente para quem conhece a natureza do Laranjal), pudemos registrar este nosso céu de planetário em tons de rosa e azul e as águas da Lagoa paradas e claras como nas melhores manhãs de verão. A cor e a luz das imagens, somadas ao bucolismo, às areias desertas (era inverno, mas temos forçosamente que pensar nas atrações do inverno…), à atmosfera de lugar intocado pelo homem (que, num paradoxo, o trapiche em ruínas parece intensificar) têm fascinado algumas pessoas que não conhecem o nosso balneário. Há gente que se deslocaria de longe para estar num lugar com este perfil. Eu seria um deles, se não tivesse o privilégio de já morar em Pelotas.Aos dezoito anos compus, no Laranjal, uma canção chamada Estrela, Estrela, que fala em “ser o que se é”. Eu pensava na natureza, essa natureza que abrange estrelas, pessoas e o próprio Laranjal. A frase parece uma obviedade, mas se pode passar uma vida inteira tentando, sem sucesso, ser o que se é. Quero dizer que o Laranjal não possui o apelo fácil do mar, mas tem lá os seus encantos, qualidades que são só dele. Acho que a chave para torná-lo um lugar atraente (não só para os turistas, mas para nós mesmos) é simplesmente deixar que ele seja o que é.Essa conversa toda é porque cheguei de viagem há pouco e me deparei com a notícia da iminente construção de grandes banheiros públicos na orla do Laranjal. Pensei imediatamente nas construções irregulares e feias que já existem sobre aquelas areias; na área de preservação ecológica da barra, atacada por posses especulativas de um lado e loteamentos acintosos do outro; nos bizarros alto-falantes afixados no alto dos postes, que, com antidemocrático mau gosto e muito volume, infernizam e espantam os banhistas; nos equipamentos de som reverberando de modo incivilizado nos porta-malas abertos dos carros domingueiros; nos coliformes fecais; nos cachorros de rua…Se nos perguntassem hoje como é o Laranjal, nós o descreveríamos como este ambiente cada vez mais degradado e hostil? Ou o pintaríamos, nos moldes do que as imagens do meu DVD sugerem, como um lugar especial, com suas figueiras centenárias, sua lagoa sem fim, sua tranqüilidade restauradora?Curiosamente a história do Laranjal parece repetir a da cidade de Pelotas. Na adolescência acostumei-me ver os defensores do nosso patrimônio histórico serem ridicularizados, chamados de ingênuos ou lunáticos. O futuro mostraria que eles estavam certos. Foi graças à mobilização de cidadãos como esses, esclarecidos e apaixonados pela cidade, bem como a iniciativas governamentais inteligentes, que se preservou em Pelotas o que hoje é a sua marca, o que faz com que ela seja o que é, ainda que seja muito menos do que poderia ser. Pois o Laranjal vive atualmente processo semelhante. Se seu patrimônio natural não for preservado ou, no mínimo, tratado com muito cuidado, seu futuro estará comprometido em pouco tempo. Há pelotenses se manifestando contra ou a favor da construção desses banheiros. É importante que se manifestem. Penso inclusive que deveriam aproveitar e ir além. Há tanta coisa degradando o Laranjal. Que aprofundem essa discussão! E penso que os administradores da cidade deveriam ouvi-los com a maior atenção e lucidez, sem preconceitos políticos ou pessoais. Todos amamos igualmente a nossa praia e queremos o melhor para ela.Dos aspectos degradantes da praia do Laranjal descritos anteriormente, os banheiros são os únicos que têm sua utilidade pública. Acho que ninguém questiona que é uma boa idéia construí-los. A população cresceu e precisa ser atendida. O que eu particularmente questiono, e nisso me somo aos que protestam contra sua construção, é que devam ser construídos sobre as areias da praia. Penso que irão agredir uma paisagem que é quase tudo que o Laranjal possui (sem falar que poderão produzir mau cheiro e até, em circunstância adversa, colocar em risco o meio ambiente). A prefeitura não poderia fazer banheiros como os novos de Copacabana, subterrâneos, com discretas muretas de vidro na entrada? Um projeto como este chegou a ser cogitado e orçado? O custo seria elevado? Neste caso não poderia haver uma parceria público-privada para realizá-lo? O Laranjal não merece tanto? E, fora essa, que alternativas ainda poderia haver, outros lugares ou outros tipos de banheiros?Gostaria de observar que não há nenhuma motivação político-partidária nesta minha manifestação. Há muitos anos desisti de apoiar este ou aquele partido. Mas de uma coisa acho não desistirei nunca, e por isso estou aqui: de esperar sempre por gestos de grandeza dos nossos administradores, gente que, entre outras coisas, nos representa na indigesta tarefa de enfrentar as pequenezas da política."

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