Sâo Paulo – Um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) divulgado no ano passado mostrou que 43% dos motoristas de carros enfrentam congestionamentos diariamente. E esta pesquisa não se refere somente a São Paulo ou metrópoles comoRio de Janeiro e Belo Horizonte. Ela inclui 143 cidades de todas as regiões do Brasil.
Conviver com o para e anda do trânsito intenso é, portanto, uma realidade nacional, mesmo que em graus variados. E a resolução desta dificuldade, uma preocupação dos eleitores do país.
“Mas não existem soluções mirabolantes. Assim como na saúde pública, elas são conhecidas e relativamente simples, só que o Estado não faz”, afirma o presidente do Instituto Brasileiro de Segurança no Trânsito (IST), David Duarte.
Abaixo, veja exemplos de medidas consideradas bem sucedidas nas cidades onde foram aplicadas. O fato de terem obtido bons resultados em outras localidades, porém, não quer dizer que possam ser importadas para o Brasil.
Afinal, Los Angeles, Londres, Cingapura, Amsterdã e Brisbane passaram por processos completamente diferentes de desenvolvimento. Mesmo assim, vale imaginar se as medidas fariam sentido ou não na sua cidade.
Na terra por excelência do automóvel – mais de 250 milhões, enquanto no Brasil não chega a 70 – uma das soluções para o tráfego passou mais por aprimorar o sistema de transporte individual que o público.
Foi o que fez a cidade de Los Angeles, na Califórnia, desde o fim dos anos 60, com a instalação das faixas HOVs, acrônimo em inglês para Veículos com Alta Ocupação, em tradução livre. Trata-se, basicamente, de faixas reservadas nas rodovias exclusivamente para automóveis com pelo menos dois ocupantes. No caso de Los Angeles, carros elétricos e alguns híbridos também podem usar a faixa exclusiva.
Segundo as autoridades de trânsito, em horários de pico, as faixas HOVs recebem por hora 1,3 mil veículos, enquanto as normais levam 1,8 mil, em média. A diferença é que a primeira transporta 3,3 mil pessoas, e a segunda 2 mil.
Para garantir o sucesso das faixas, o governo do sul da Califórnia mantém um programa de compartilhamento de caronas com mais de 250 mil inscritos.
Curiosa foi a forma que alguns motoristas usaram para driblar a fiscalização nos primeiros anos do sistema, usando bonecos infláveis ou manequins como passageiros. A multa por se aproveitar da faixa HOV sem um segundo ocupante pode chegar hoje a salgados 381 dólares.
LONDRES (REINO UNIDO) – SEMÁFOROS INTELIGENTES
Os ônibus na capital britânica possuem faixas exclusivas, assim como em algumas cidades brasileiras. Mas para que as pessoas realmente optem por este meio de transporte, são usados semáforos inteligentes, que se comunicam com os coletivos e adaptam o tempo de vermelho e verde de acordo com a presença destes. No Brasil, Curitiba tem sistema similar.
“Se o semáforo ainda tiver 30 segundos de verde e o ônibus estiver chegando, ele não faz nada. Mas se o tempo for menor, ele calcula o quanto ônibus vai demorar e dá um chorinho até o ônibus passar. No vermelho, ele pode abreviar para o corredor do ônibus”, explica o consultor em engenharia de tráfegos e transporte Horácio Figueira.
Segundo uma instituição de pesquisa de transporte de Londres, a
RAC, em 2008, eram mais de 6 mil semáforos na capital britânica, com 3,2 mil programados para dar prioridade ao transporte coletivo.
Nos anos 70, semáforos e ônibus se comunicavam por radiofrequência. Hoje, já há meios mais modernos. A implementação deste sistema foi considerada “relativamente fácil” e “com baixo custo” pelo engenheiro norte-americano e especialista em transportes, Thomas Urbanik, ainda em 1977.
CINGAPURA – PEDÁGIO URBANO
Roma, Oslo, Londres e Milão são cidades europeias que adotam o polêmico sistema de tarifação conhecido popularmente como pedágio urbano. Foi Cingapura, porém, a primeira nação a adotar o sistema, em 1975, mantendo-o até hoje.
No começo, a restrição foi adotada somente no horário de pico da manhã, e apenas mais de uma década depois passou valer também para o horário de volta.
Segundo um
trabalho brasileiro sobre pedágio urbano, logo no começo, o governo de Cingapura contabilizou uma redução de 25% no número de acidentes de trânsito. A utilização do transporte público passou de 46% para 63% da população.
É preciso ressaltar que o pedágio veio acompanhado por investimentos no setor público de transportes. Em 1998, a cobrança passou a ser feita automaticamente, como pode ser visto na foto ao lado.
Grandes cidades do mundo pensam hoje em implantar o pedágio urbano. Uma delas é Nova Deli, na Índia, onde a frota de motos e carros passa de cinco milhões, contra meio milhão em Cingapura. Nestes casos, as dificuldades operacionais são maiores.
AMSTERDÃ (HOLANDA) – CICLOVIAS
Alguns ciclistas brasileiros são ativistas da causa de tornar as cidades brasileiras mais amigáveis para bicicletas. Neste sentido, os 400 quilômetros dasfietspaden (ciclovias) de Amsterdã podem ser consideradas um dos sonhos de “consumo” para quem deseja uma maior participação das bikes no transporte urbano.
Como política de transporte, uma bicicleta a mais pode significar um carro a menos nas ruas. Em toda a Holanda, quase
30% das locomoções são feitas por bicicleta e o uso destas por crianças para ir e vir da escola é massivo. Não é raro ver jovens indo para “baladas” com as magrelas.
Em Amsterdã, tornar as ruas seguras para bicicletas significou basicamente dar a elas o mesmo tratamento dispensado aos carros: construção de espaços exclusivos, separadas dos veículos, com semáforos e sinalização próprios, além da criação de estacionamentos por toda a cidade, como o da foto ao lado, na Estação Central de trem.
Claro que a massificação do uso da bicicleta torna estas mais atraentes para ladrões, por isso é preciso cuidado, já que milhares delas são roubadas por ano na capital holandesa.
BRISBANE (AUSTRÁLIA) – ESTACIONAMENTOS PARK AND RIDE
O conceito de “Park and Ride” consiste basicamente em construir estacionamentos perto ou ao redor de estações de trem, metrô e ônibus. A medida visa unir o melhor de dois mundos: o motorista tem a comodidade de não ter que andar de casa até o ponto de transporte público – que não raro fica longe – e evita os congestionamentos e caros estacionamentos da região central de uma cidade.
Ao mesmo tempo, a medida consegue retirar veículos da área mais lotada do município.
Em Brisbane, os
Park and Ride são construídos a uma distância mínima de 10 quilômetros do centro, mas moradores que moram dentro deste raio pedem que esta
distância seja encurtada. Um desafio que exige estudo das autoridades de trânsito é que alguns desses estacionamentos gratuitos ficam lotados e acaba sobrando carro para a vizinhança onde estão localizados.
O conceito de Park and Ride pode ser visto em várias cidades do mundo, com variados graus de implementação. Em São Paulo, algumas estações de metrô possuem o E-Fácil.
*Publicado na Exame, em 26/06/2012.